Mensalão e torcidas organizadas
O Brasil está claramente dividido em duas torcidas organizadas. Quem é contra o PT já condenou todos os réus. Quem é favorável já os absolveu
Os estudos neurocientíficos demonstram (consoante afirmação de Hélio Schwartsman, Folha de S. Paulo de 15.06.11, p. C10) que nosso inconsciente (em razão da história, da experiência e das memórias de cada um) chega logo a um veredito, de acordo com nossas pré-compreensões, sentimentos, inclinações, crenças (ideologias). Depois a parte racional do cérebro se põe a elaborar argumentos para justificar a pré-conclusão (muitas vezes ancorada num pré-conceito, num pré-juízo, totalmente infundado).
O inconsciente de muita gente já julgou o caso mensalão assim como o próprio STF. O sensacionalismo midiático o entronizou no cotidiano de milhões de brasileiros. Os réus são acusados de vários crimes e quando se fala em crime, como afirma Durkheim, surge uma reação emocional vingativa e punitivista (queremos castigo para o fato, para quem erra, para quem prejudica com seu ato terceiras pessoas: isso é da natureza humana). De acordo com a convicção popular tudo que é feito de errado tem que ser punido (pois do contrário isso pode se repetir). Desde o fato de uma criança deixar cair o sorvete até o cometimento de um crime hediondo: nossas (atávicas) emoções reclamam punição para todos os desvios comportamentais. O castigo é da essência da natureza humana. Mas o sentimento que eclode, com frequência, é o de vingança.
Muitos já fizeram seus pré-julgamentos. O Brasil está claramente dividido em duas torcidas organizadas. Quem é contra o PT já condenou todos os réus. Quem é favorável já os absolveu (ou pelo menos não os vê com antipatia). Eu não pertenço nem a um grupo nem a outro. Espero que se faça justiça, respeitando-se todas as regras do devido processo legal. Nós, brasileiros, costumamos julgar tudo emocionalmente (ou ideologicamente). Quando se trata de decisão judicial, nos preocupamos sempre só com o resultado, não com o conteúdo das decisões. Raramente discutimos os argumentos que cada juiz sustenta e publica. Mas o que importa é a essência das coisas, não suas aparências.
Os Ministros do STF devem ser julgados pelos seus votos. Cada um é responsável pelo que fala e pelo que escreve. Os julgamentos jurídicos devem seguir a lei e as provas do processo. Com base nisso é que os Ministros votam. Cada um apresenta seus argumentos. Nós temos que julgá-los de acordo com o que eles decidem. Pena é que muitos já estão com a cabeça feita. Como disse Elio Gaspari, "ficarão alegres ou tristes, como se saíssem de uma competição esportiva, mas estão perdendo uma oportunidade [de ouro] de enriquecer seu sentido de justiça".
Luiz Flavio Gomes é jurista e cientista criminal, fundador da Rede de Ensino LFG, codiretor do Instituto Avante Brasil e do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001)
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