Diga lá, amigo. Além de odiar o Lula, o que mais você faz na vida?
Rodopiou
Neste sentido, não são eventos isolados a reação conservadora no congresso, patrocinada especialmente pela bancada evangélica, principalmente contra homossexuais; o sexismo crescente e a violência, seja física ou simbólica, contra mulheres; a desqualificação do movimento negro e de algumas de suas conquistas, notadamente as políticas de cotas; a tentativa de reduzir a menoridade penal; a militarização crescente da segurança pública, a transformar cada vez mais a população civil, em especial os movimentos sociais, em inimigos potenciais das polícias militares.
Estes e outros não são isolados nem se dissociam da campanha de ódio movida contra o ex-presidente. Desmoralizá-lo, desqualificá-lo, rebaixá-lo à condição de pária criminoso, é parte de uma ação coordenada que não visa nem odeia apenas Lula. ele é o símbolo que se quer destruir, a memória que se pretende apagar.
Mas nós, as esquerdas, sejamos ou não lulistas ou petistas (e muitos somos libertários e anarquistas; simpáticos a Lula e ao PT talvez, mas nem por isso a eles vinculados), somos igualmente odiados e odiosos.
E se a direita conservadora nos odeia, não é hora de retribuir-lhes o ódio com flores.
Clóvis Grunner é doutor em História e professor da Universidade Federal do Paraná
Rodopiou
Se os Josés Dirceu e Genoínos proclamam inocência e alegam ter sido
político o julgamento e consequente condenação no STF, são rapidamente
desqualificados por jornalistas, comentaristas e palpiteiros de plantão,
todos obviamente profissionais preocupados em tão somente informar, com
zelo e responsabilidade, sem influências políticas, partidárias ou
ideológicas.
Mas nem tão curiosamente, eles são os mesmos que tomam como verdade
inquestionável o depoimento de Marcos Valério, condenado a 40 anos de
prisão pelo mesmo STF e pelos mesmos crimes, quando este, sem uma única
prova a não ser seu testemunho para lá de suspeito (afinal, trata-se da
palavra de um criminoso condenado tentando salvar sua pele, certo?),
acusa Lula de ser o principal mandante do mensalão e de ter sido
ameaçado de morte por lideranças do PT.
Pouco importa se durante todo o processo nenhum dos ministros, a começar
pelo relator, Joaquim ‘Batman’ Barbosa, encontrou evidências da
participação de Lula, que sequer foi mencionado ao longo do julgamento.
afinal, se Marcos Valério disse, deve ser verdade.
Faz tempo que deixei o PT, mais de uma década e meia. Neste tempo, votei
no partido em algumas eleições; anulei ou justifiquei o voto em outras;
na deste ano, optei pelo PSOL. Também já não tenho a mesma admiração e
respeito que tinha por Lula, por exemplo, em 1989, embora lhe reconheça
os méritos e continue a acreditar que ele fez o melhor governo de nossa
história republicana, em que pese os equívocos, muitos, inclusive as
seguidas denúncias de corrupção – aliás, investigadas, ao contrário do
engavetamento geral que era característica dos governos FHC, a começar
pela compra de votos no congresso para assegurar a reeleição do
sociólogo, que mereceu um silêncio quase geral e sobre o qual nem mesmo
se chegou a formalizar qualquer denúncia.
Mas é difícil permanecer calado diante da verdadeira campanha de
desmoralização, orquestrada principalmente pela imprensa e mídia, contra
o ex-presidente, a quem desejam transformar, a qualquer custo e não
importam os meios, em um criminoso.
Ódio de classe? em parte, certamente sim. Embora distante de suas
origens, a trajetória de Lula sintetiza e denuncia, pela raridade, os
arranjos políticos de uma democracia que com raríssimas exceções,
pautou-se sempre mais por um esforço de exclusão que de inclusão.
Incomoda a Casa Grande que um nordestino, ex-operário e ex-sindicalista,
não apenas tenha chegado ao governo liderando um partido e uma aliança
de esquerda, como tenha conseguido fazer o que eles, os que habitam a
casa grande, jamais fizeram, por incompetência, insensibilidade e
descaso: um governo capaz de atender, mesmo que precariamente em se
tratando de um país e uma população com tantas mazelas, parcelas da
população historicamente relegadas à indiferença dos poderes públicos.
Incomoda, igualmente, que sua ação orquestrada não tenha conseguido
ainda abalar a popularidade de que Lula goza no Brasil e o respeito que
conquistou no exterior.
Sem um projeto para o país, para o qual sempre se lixou; incapaz de
fazer frente aos avanços, alguns tímidos, dos movimentos sociais os mais
diversos, à direita resta fazer do ressentimento e do ódio os afetos
privilegiados, talvez únicos, a pautar suas ações públicas e midiáticas.
Neste sentido, não são eventos isolados a reação conservadora no congresso, patrocinada especialmente pela bancada evangélica, principalmente contra homossexuais; o sexismo crescente e a violência, seja física ou simbólica, contra mulheres; a desqualificação do movimento negro e de algumas de suas conquistas, notadamente as políticas de cotas; a tentativa de reduzir a menoridade penal; a militarização crescente da segurança pública, a transformar cada vez mais a população civil, em especial os movimentos sociais, em inimigos potenciais das polícias militares.
Estes e outros não são isolados nem se dissociam da campanha de ódio movida contra o ex-presidente. Desmoralizá-lo, desqualificá-lo, rebaixá-lo à condição de pária criminoso, é parte de uma ação coordenada que não visa nem odeia apenas Lula. ele é o símbolo que se quer destruir, a memória que se pretende apagar.
Mas nós, as esquerdas, sejamos ou não lulistas ou petistas (e muitos somos libertários e anarquistas; simpáticos a Lula e ao PT talvez, mas nem por isso a eles vinculados), somos igualmente odiados e odiosos.
E se a direita conservadora nos odeia, não é hora de retribuir-lhes o ódio com flores.
Clóvis Grunner é doutor em História e professor da Universidade Federal do Paraná
Leia mais em: Blog Sujo : Não é hora de falar em flores
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