Por Paulo Moreira Leite, na coluna Vamos combinar:
Não há motivo para surpresa no voto de Celso de Mello, autorizado o
Supremo a cassar o mandato de parlamentares. Embora a decisão contrarie o
artigo 55 da Constituição, que determina expressamente que cabe a
Câmara cassar o mandato de deputados – e ao Senado, fazer o mesmo com
senadores – este voto era previsível.
A maior surpresa veio depois. Após anunciar seu voto, Celso de Mello declarou que qualquer reação do Congresso, contrariando sua decisão, será “intolerável, inaceitável e incompreensível.” Ele ainda definiu que seria “politicamente irresponsável” e “juridicamente inaceitável.” Mais: seria uma “insubordinação”.
São palavras que pressupõem uma relação de autoridade entre poderes. Celso de Mello disse que há atitudes que o STF pode tolerar ou não.
Pode compreender, aceitar ou não. Quem fala em insubordinação fala em hierarquia.
Confesso que percorri a Constituição e não encontrei nenhum artigo que dissesse que o Congresso é um poder “subordinado” ao STF. A Constituição diz, em seu artigo primeiro, que “todo poder emana do povo, que o exerce através de seus representantes eleitos.”
Acho coerente com este artigo numero 1 que caiba ao presidente da República escolher os ministros do Supremo. E o Senado referenda – ou não – a escolha. Sempre entendi que há uma harmonia entre os poderes. Devem tolerar-se e respeitar-se. Mas, se há uma hierarquia ela se define pelo voto.
Foi Luiz Inácio Lula da Silva quem indicou Joaquim Barbosa, posteriormente aprovado pelos senadores. O mesmo aconteceu com Celso de Mello, indicado por José Sarney. Ou com Gilmar Mendes, indicado por Fernando Henrique Cardoso. Foram os eleitores que escolheram Lula e Fernando Henrique. Sarney foi escolhido pelo Colégio Eleitoral, expressando, de forma indireta e distorcida, a vontade dos eleitores.
E foi pelo voto de 407 constituintes, ou 72% do plenário, escolhido por 66 milhões de brasileiros, que se escreveu o artigo 55, aquele que garante que o mandato será cassado (ou não) por maioria absoluta de parlamentares. É um texto tão cristalino que mesmo o ex-ministro Carlos Velloso, favorável a que a Câmara cumpra automaticamente a decisão do STF, admite, em entrevista a Thiago Herdy, no Globo de hoje: “No meu entendimento, ao Supremo cabia condenar e suspender os direitos políticos e comunicar a Câmara, a quem caberia cassar o mandato.”
No mesmo jornal, Dalmo Dallari, um dos grandes constitucionalistas brasileiros, afirma: “o constituinte definiu e deu atribuição ao Legislativo para que decida sobre a matéria. O Parlamento, em cada caso, verifica se é a hipótese de perda de mandato.” Para Dallari, “temos que obedecer o que a Constituinte estabeleceu. Então eu só vou obedecer naquilo que me interessa? No que estou de acordo? Não tem sentido.”
Ao se apresentar como poder moderador entre a Justiça e o Parlamento, na Constituinte de 1824, Pedro I disse que aceitaria a Constituição desde que…”ela fosse digna do Brasil e de mim.”
Hoje, a Folha de S. Paulo, define a decisão do STF, de cassar os mandatos, como um “mau passo.” O jornal explica:
“O fundamento dessa interpretação está na própria Constituição. O parágrafo segundo do artigo 55 diz que somente o Congresso pode decidir sobre cassação de mandatos de deputados condenados. A regra se baseia no princípio de freios e contrapesos - neste caso, manifesta na necessidade de preservar um Poder de eventuais abusos cometidos por outro.
Com a decisão de ontem, como evitar que, no futuro, um STF enviesado se ponha a perseguir parlamentares de oposição? Algo semelhante já aconteceu no passado, e a única garantia contra a repetição da história é o fortalecimento institucional.”
Essa é a questão. O artigo 55 destinava-se a proteger os direitos do eleitor, ao garantir que só representantes eleitos podem cassar representantes eleitos.
Com sua atitude, o Supremo cria um impasse desnecessário.
Se a Câmara aceita a medida, transforma-se num poder submisso. Se rejeita, será acusada de insubordinação frente a Justiça.
É fácil compreender quem ganha com essa situação. Não é a democracia. Só os candidatos a Pedro I.
E isso é que é mesmo “intolerável, inaceitável, incompreensível…”
A maior surpresa veio depois. Após anunciar seu voto, Celso de Mello declarou que qualquer reação do Congresso, contrariando sua decisão, será “intolerável, inaceitável e incompreensível.” Ele ainda definiu que seria “politicamente irresponsável” e “juridicamente inaceitável.” Mais: seria uma “insubordinação”.
São palavras que pressupõem uma relação de autoridade entre poderes. Celso de Mello disse que há atitudes que o STF pode tolerar ou não.
Pode compreender, aceitar ou não. Quem fala em insubordinação fala em hierarquia.
Confesso que percorri a Constituição e não encontrei nenhum artigo que dissesse que o Congresso é um poder “subordinado” ao STF. A Constituição diz, em seu artigo primeiro, que “todo poder emana do povo, que o exerce através de seus representantes eleitos.”
Acho coerente com este artigo numero 1 que caiba ao presidente da República escolher os ministros do Supremo. E o Senado referenda – ou não – a escolha. Sempre entendi que há uma harmonia entre os poderes. Devem tolerar-se e respeitar-se. Mas, se há uma hierarquia ela se define pelo voto.
Foi Luiz Inácio Lula da Silva quem indicou Joaquim Barbosa, posteriormente aprovado pelos senadores. O mesmo aconteceu com Celso de Mello, indicado por José Sarney. Ou com Gilmar Mendes, indicado por Fernando Henrique Cardoso. Foram os eleitores que escolheram Lula e Fernando Henrique. Sarney foi escolhido pelo Colégio Eleitoral, expressando, de forma indireta e distorcida, a vontade dos eleitores.
E foi pelo voto de 407 constituintes, ou 72% do plenário, escolhido por 66 milhões de brasileiros, que se escreveu o artigo 55, aquele que garante que o mandato será cassado (ou não) por maioria absoluta de parlamentares. É um texto tão cristalino que mesmo o ex-ministro Carlos Velloso, favorável a que a Câmara cumpra automaticamente a decisão do STF, admite, em entrevista a Thiago Herdy, no Globo de hoje: “No meu entendimento, ao Supremo cabia condenar e suspender os direitos políticos e comunicar a Câmara, a quem caberia cassar o mandato.”
No mesmo jornal, Dalmo Dallari, um dos grandes constitucionalistas brasileiros, afirma: “o constituinte definiu e deu atribuição ao Legislativo para que decida sobre a matéria. O Parlamento, em cada caso, verifica se é a hipótese de perda de mandato.” Para Dallari, “temos que obedecer o que a Constituinte estabeleceu. Então eu só vou obedecer naquilo que me interessa? No que estou de acordo? Não tem sentido.”
Ao se apresentar como poder moderador entre a Justiça e o Parlamento, na Constituinte de 1824, Pedro I disse que aceitaria a Constituição desde que…”ela fosse digna do Brasil e de mim.”
Hoje, a Folha de S. Paulo, define a decisão do STF, de cassar os mandatos, como um “mau passo.” O jornal explica:
“O fundamento dessa interpretação está na própria Constituição. O parágrafo segundo do artigo 55 diz que somente o Congresso pode decidir sobre cassação de mandatos de deputados condenados. A regra se baseia no princípio de freios e contrapesos - neste caso, manifesta na necessidade de preservar um Poder de eventuais abusos cometidos por outro.
Com a decisão de ontem, como evitar que, no futuro, um STF enviesado se ponha a perseguir parlamentares de oposição? Algo semelhante já aconteceu no passado, e a única garantia contra a repetição da história é o fortalecimento institucional.”
Essa é a questão. O artigo 55 destinava-se a proteger os direitos do eleitor, ao garantir que só representantes eleitos podem cassar representantes eleitos.
Com sua atitude, o Supremo cria um impasse desnecessário.
Se a Câmara aceita a medida, transforma-se num poder submisso. Se rejeita, será acusada de insubordinação frente a Justiça.
É fácil compreender quem ganha com essa situação. Não é a democracia. Só os candidatos a Pedro I.
E isso é que é mesmo “intolerável, inaceitável, incompreensível…”
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