O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) decidiu ontem, por
unanimidade, instaurar um processo administrativo disciplinar (PAD) para
apurar a conduta do procurador de Justiça do Ministério Público de
Goiás e ex-senador Demóstenes Torres. Esse é o primeiro passo para a
perda do cargo. O mandato de senador foi cassado em 11 de julho por ter
se colocado a serviço da organização criminosa comandada pelo bicheiro
Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
Os conselheiros, com base no voto do corregedor nacional do Ministério
Público, Jeferson Coelho, também determinaram o afastamento cautelar de
Demóstenes por 60 dias, prorrogáveis por igual período, e trouxeram para
análise do conselho o procedimento disciplinar que estava em curso em
Goiás.
Mesmo afastado, o ex-senador continuará recebendo o salário de R$ 24,2
mil. O procedimento instaurado em Goiás será juntado (avocado) ao
processo administrativo. Demóstenes já estava afastado das funções desde
10 de outubro. "É um afastamento que foi posterior à nossa notificação
para esta sessão. Ele foi intimado para participar deste julgamento no
dia 4 de outubro e só foi afastado no dia 10", justificou Jeferson
Coelho.
No voto proferido ontem, Coelho sugeriu a expulsão de Demóstenes. O
grande debate se dá, no entanto, em relação à vitaliciedade do cargo. O
corregedor nacional do Ministério Público explicou que a Constituição de
1988 tornou vitalício todos os membros do órgão. Quem já fazia parte da
instituição poderia optar pelo modelo anterior. Nesse caso, perderia a
vitaliciedade. No entanto, poderia advogar, se filiar a partidos
políticos e concorrer a cargos eletivos sem a necessidade de pedir
exoneração do MP. Foi justamente essa a opção feita por Demóstenes
Torres.
"Há uma discussão sobre a vitaliciedade do senador Demóstenes, que vai
ser objeto de uma análise jurídica. Se o entendimento for no sentido de
que ele não é vitalício, o próprio conselho tem autonomia para julgar a
perda do cargo. Se o entendimento for que ele é vitalício, pode culminar
com a proposta de ajuizamento da ação de perda de cargo. Nesse último
caso, ele só poderia ser demitido por uma decisão judicial", esclareceu
Coelho.
Além da perda do cargo, que é a maior punição prevista na legislação, o
CNMP pode apenas adverti-lo ou aposentá-lo compulsoriamente.
Visivelmente irritado e falando alto, o advogado de Demóstenes Torres,
Neilton Cruvinel Filho, usou os 15 minutos a que tinha direito durante a
sustentação oral para atacar o CNMP e a imprensa. Em nenhum momento,
fez a defesa do seu cliente. Afirmou que "a imprensa só quer sangue" e
que "o CNMP não respeitou o devido processo legal".
Pedido de desculpas
O ex-parlamentar foi cassado após acusações de envolvimento com o grupo
do bicheiro Carlinhos Cachoeira. As denúncias surgiram em março. Durante
o período em que tentou se defender das acusações, o ex-parlamentar
chegou a pedir desculpas a cada um de seus colegas e disse ser vítima de
um processo de difamação causado pelo vazamento de conversas gravadas
pela Polícia Federal durante as operações Vegas e Monte Carlo. Os
argumentos não convenceram nem a opinião pública nem os senadores.
Demóstenes ficou inelegível por oito anos, contados a partir do fim do
mandato para o qual foi eleito. Dessa maneira, só poderá concorrer a um
cargo político em 2027. No lugar dele, assumiu o suplente Wilder Pedro
de Morais, que era secretário de Infraestrutura do governo de Goiás.
Nas interceptações telefônicas, Demóstenes alerta Cachoeira sobre
operações do Ministério Público e da Polícia Federal, orientava o amigo
sobre projetos de lei que dificultariam a vida do contraventor e deixava
evidente que era o braço político da quadrilha. Na sessão de ontem,
Jeferson Coelho leu alguns dos diálogos travados entre o bicheiro e o
ex-senador.
Memória
As denúncias da Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, levaram o
Conselho Nacional do Ministério Público a decidir, no ano passado, pela
demissão do ex-chefe do Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios (MPDFT) Leonardo Bandarra (foto) e da promotora de Justiça
Débora Guerner. Ele foi acusado de vazar informações sigilosas,
concussão (quando um agente público usa o cargo para obter vantagem) e
de extorquir dinheiro do então governador do Distrito Federal, José
Roberto Arruda. No entanto, Bandarra e Guerner só podem ser expulsos
definitivamente do Ministério Público após decisão judicial. A
expectativa é que a briga na Justiça dure, pelo menos, uma década.
Diferentemente do caso de Demóstenes Torres, Bandarra e Débora Guerner
tinham cargos vitalícios por terem ingressado na instituição após 1988.
Por isso, o CNMP não tem autonomia para expulsá-los sem uma decisão da
Justiça.
Atualmente, Bandarra e Guerner respondem a quatro ações penais por
suposto envolvimento em casos de corrupção apontados a partir da
Operação Caixa de Pandora, além de ação civil pública para perda do
cargo. A Operação Caixa de Pandora, que apurou esquema de corrupção no
Governo do Distrito Federal, foi deflagrada pela Polícia Federal em
2009.
Este ano, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF),
concedeu liminar para garantir que os promotores continuem recebendo
salários enquanto durar o processo. Mendes suspendeu a aplicação do
artigo 208, parágrafo único, da Lei Complementar 75/93, que rege o
Ministério Público Federal (MPF), segundo o qual o promotor que estiver
respondendo a ação por perda do cargo fica afastado das funções e tem os
salários e todas as vantagens pecuniárias suspensos. As informações são
do Correio Braziliense
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