Por
Davis Sena Filho — Blog Palavra Livre
Réveillon de
2009. Hora antes da virada de ano. O
tom do comentário foi de desprezo, ironia, torpeza, e, mais do que tudo:
profundo preconceito social, pois arraigado em sua alma elitista, e, ao que
parece, em seus mais secretos princípios, guardados em segredos e somente
pronunciados àqueles que o Boris Casoy considera como seus iguais.
"Que merda! Dois lixeiros desejando
felicidades do alto das suas vassouras. O mais baixo na escala do
trabalho" — comentou, o mordaz e inconformado Casoy ao
seu colega, Joelmir Beting, politicamente tão conservador como ele, com a presença
de garis na tela da Band, a desejarem “feliz ano novo” no intervalo
publicitário do Jornal da Band.
Eis
que um dos garis, o senhor Francisco Gabriel de Lima, tal qual ao “âncora” da
Band ficou igualmente inconformado com tamanha falta de respeito, e, sentindo-se
humilhado ainda mais porque milhões de telespectadores ouviram tais impropérios
do veterano jornalista, procurou seus direitos na Justiça, que depois de quase
três anos condenou a TV Bandeirantes e o jornalista Boris Casoy a pagarem R$ 21
mil ao trabalhador que se sentiu ofendido, desconsiderado.
O gari Francisco, em 2009, na Band (d): processo na Justiça e indignação. |
À época,
ao saber que o áudio foi ao ar e ao vivo e com isso permitiu que sua opinião
sobre os garis estava a ser visualizada e ouvida por milhares de internautas, o
conservador jornalista decidiu se retratar em público e na tevê. Casoy afirmou
que suas palavras foram “infelizes” e pediu “profundas” desculpas aos garis e a
todos os telespectadores
Eu
vi e ouvi suas desculpas, pois soube do grande furo na internet por intermédio
de amigos, de colegas de trabalho e fiquei atento para assistir o Jornal da Band. Contudo, Casoy se
desculpou mecanicamente, conciso, lacônico, quase a demonstrar tédio ou enfado.
Percebia-se a má vontade e a falta de arrependimento para se desculpar, bem
como sua incondicional e inseparável arrogância. Não poderia ser o contrário,
afinal ele integra um grupo de jornalistas que trata seus patrões como colegas,
quando na verdade são empregados, de confiança, lógico, mas sempre empregados.
A
família Saad, proprietária do Grupo Bandeirantes, não gostou da determinação da
8ª Câmara de Direito Privado de São Paulo e já anunciou que vai recorrer,
porque está inconformada em ter que pagar o gari, ou seja, ressarci-lo por o
seu empregado ter humilhado, em público, os garis que saudaram os telespectadores
da Band, com o desejo de um próspero
ano novo. O advogado da família midiática considera que o gari “quer ganhar
dinheiro fácil”. Além das palavras ríspidas e grosseiras do Boris, o trabalhador tem de ouvir picardia barata como essa.
"Vou ajudar os garis a limpar toda essa sujeira das ruas e da imprensa". |
Nada
é tão emblemático e sintomático quando ouvimos advogado como esse, porque temos
a oportunidade de confirmarmos mais uma vez a forma cruel e preconceituosa de
agir da burguesia brasileira, separatista, arrivista, hedonista e que luta,
incessantemente, por um País VIP, para poucos privilegiados, como se fosse um
clube privê à disposição dos
herdeiros ideológicos da escravidão viverem intensamente seus sonhos de
superioridade racial, de classe e de consumo a seus bel-prazeres.
Para
os inquilinos das classes abastadas e hegemônicas, a intenção do gari de ganhar
dinheiro (mesmo com a determinação do Judiciário) não condiz com sua classe
social e sua origem natural. Os capitalistas poderosos pensam assim, sem sombra
de dúvida. Essas coisas se percebem quando ouvimos o gari Francisco alegar que “jamais
pensou que sua participação”, no intervalo do Jornal da Band, acarretaria em “preconceito e discriminação”.
O
TJSP considerou que “as desculpas {do Casoy} não são suficientes para reparar o
dano causado ao gari”, e completou: “Francisco Lima avisou aos familiares que
iria aparecer na televisão”, e completou: “Lamentável ocorrência efetivamente
ofendeu a dignidade do autor (gari)”. Os Saad donos da Band não aceitam e acham que o gari está a se aproveitar para ter
vantagens monetárias. É dessa forma que os barões da imprensa, os donos das
mídias de negócios privados.
Quem ri agora é o gari Francisco Gabriel. |
O
gari de origem pobre e nordestina, acompanhado de um colega, é humilhado e sua
profissão, uma das mais úteis e importantes para a sociedade ao tempo que de
alta insalubridade, tem sua queixa atendida pelo Judiciário, que, ao contrário
do que fizeram no STF, não foi necessário distorcer e manipular a tese do “domínio
do fato” para verificar e compreender que o senhor Boris Casoy “pisou na bola” e,
como ensina o adágio popular: “Quem fala de mais dá bom dia a cavalo”. É isso aí.
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