MARCUS VINÍCIUS
Ao condenar com base em evidências, e não com base em provas, é como se o supremo relator bradasse: “Toda presunção de inocência será negada”!
Está escrito nos evangelhos de Mateus e João: Caifás teve participação
de destaque no julgamento de Jesus organizado pelo Sinédrio. Por ser um
sumo sacerdote, Caifás também ocupava a posição de chefe da Corte
Suprema judaica. De acordo com os evangelhos Jesus foi preso pela guarda
do Templo de Jerusalém, e foi levado diante de Caifás e outros, por
quem foi acusado de blasfêmia.
No Evangelho segundo Mateus (Mateus 26:57-67) Caifás, juntamente com
outros sumos sacerdotes e o Sinédrio da época, é retratado interrogando
Jesus, procurando por "falsas evidências" com as quais possa incriminar
Jesus, porém não consegue descobri-las. Jesus permanece em silêncio
durante o processo, até que Caifás lhe exige que diga se ele é o Cristo.
Jesus declara implicitamente que o é, e faz uma alusão ao Filho do
Homem, que o sumo sacerdote veria "assentado à direita do Poder, e vindo
sobre as nuvens do céu." Caifás e os outros homens o acusam de
blasfêmia, e ordenam que seja espancado. Após considerá-lo culpado, o
Sinédrio entregou-o ao governador romano Pôncio Pilatos, por quem Jesus
também foi acusado de sedição contra Roma.
Segue-se então que Pilatos apresenta Jesus à multidão, juntamente com
outro prisioneiro, Barrabás. Por ocasião da Pascoa, era tradição daquela
época libertar um prisioneiro. Caifás e outros sacerdotes instigam a
multidão a gritar pela libertação de Barrabás, e assim, selam o destino
de Jesus, que é encaminhado para a crucificação.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Penal 470, vulgarmente
conhecida como “Mensalão”, tem personagens que se assemelham, em muito,
a Corte Suprema judaica nos tempos de Cristo. O rito sumário, o
julgamento sem provas, a sentença capital. Por tudo isto é possível
comparar o ministro Joaquim Barbosa com o sumo sacerdote Caifás. A
atuação de ambos não visa conhecer a verdade. O objetivo, naqueles dias e
hoje, é o da condenação.
E quem era superior a Caifás naquele julgamento de Cristo senão o
governador romano Pôncio Pilatos? Pois tal e qual, o presidente do STF,
Carlos Ayres Brito, lava as suas mãos diante do festival de grosserias e
impropriedades cometidas pelo ministro Joaquim Barbosa no decorrer do
julgamento.
Assim como Caifás, o ministro Joaquim Barbosa joga com a plateia. Com
apoio da mídia ultra-conservadora e da TV Justiça, instiga a população
contra os réus. Ele não julga, condena. E não apenas condena, instiga o
povo ao linchamento moral dos acusados, à mesma maneira que Caifás
ordenou o suplício do Galileu.
Não há Cristo ou salvadores sendo julgados no STF. Mas há ali homens e
mulheres que foram privados de sua humanidade. Sua dignidade e seus
direitos foram vilipendiados. Ao condenar com base em evidências, e não
com base em provas, é como se o supremo relator bradasse: “Toda
presunção de inocência será negada”!
Ao seu tempo, Caifás estava a serviço da reação. Seu objetivo era claro:
evitar o surgimento de uma nova religião entre os judeus. E o que está
por detrás, pergunto eu, do açodamento do relator e da passividade do
presidente?
Por que o “Mensalão Tucano” foi desmembrado, ou seja, será julgado
inicialmente em primeira instância e só depois, eventualmente, pelo STF,
enquanto o dito “Mensalão Petista” foi negada a possibilidade de
julgamento em duas instâncias?
Por que a compra de votos feita pelo presidente Fernando Henrique
Cardoso (PSDB) para a aprovação da emenda da reeleição nunca foi
julgada?
Por que os processos contra o PT e seus aliados correm mais céleres?
Por que há dois pesos e duas medidas.
O mesmo Cristo ensinou: “com a medida que medires, também serás medido”.
Convenhamos. Caifás não ocupa o melhor lugar na história. Será assim que Joaquim Barbosa gostaria de ser lembrado?
Marcus Vinícius é jornalista e edita o www.marcusvinicius.blog.br
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