Depois da privataria tucana, Vale não quer pagar R$35 bilhões que deve à União
A Vale, que foi vendida por R$3 bilhões em moedas podres por FHC, agora deve R$35 bilhões à União. E não quer pagar. Ela movimenta-se de todos os jeitos para não pagar. Mas o problema do Brasil é o “mensalão”!Rodrigo Haidar, via Advivo
A audiência pública realizada na quarta-feira, dia 20, pelo Conselho Nacional de Justiça para discutir a legitimidade da cessão de procuradores da Fazenda e advogados públicos para trabalhar em gabinetes de juízes foi entremeada por uma discussão sobre a execução fiscal de R$35 bilhões que a mineradora Vale contesta na Justiça Federal do Rio de Janeiro. A partir do processo administrativo, o CNJ poderá fixar critérios mais objetivos sobre a requisição de servidores de outros órgãos por juízes e desembargadores.
A discussão foi provocada pela seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil. A entidade entrou com Procedimento de Controle Administrativo (PCA) contra o Tribunal Regional Federal da 2ª Região. De acordo com a OAB/RJ, a cessão de procuradores da Fazenda Nacional para trabalhar como assessores de desembargadores que compõem as turmas responsáveis por julgar matérias de Direito Tributário naquele tribunal viola o princípio da paridade de armas. O relator do processo no CNJ é o conselheiro José Lúcio Munhoz, que comandou a audiência desta quarta.
Apesar de todos os representantes das dez entidades que compareceram à audiência pública ressaltarem que o que está em discussão não era apenas um caso concreto, ganhou destaque nos debates o fato de a procuradora da Fazenda Nacional no Rio Patrícia de Seixas Lessa ter atuado no processo contra a Vale como procuradora e, depois, ter sido requisitada para trabalhar no gabinete do juiz federal convocado Theophilo Antônio Miguel Filho, relator de recurso da mineradora no TRF-2.
Patrícia Seixas é a única procuradora da Fazenda Nacional cedida ao tribunal. O juiz Teophilo negou a suspensão da cobrança bilionária enquanto tramita ação cautelar da empresa. O representante do Centro de Estudos de Sociedades de Advogados (Cesa) na audiência, Roberto Duque Estrada, afirmou que “a situação concreta do processo é emblemática”. De acordo com ele, “a procuradora fez sustentação oral no processo, atuou, e depois foi assessorar o juiz responsável por decidir a causa”. O advogado é sócio do escritório Xavier Bragança Advogados, que defende a Vale no processo.
Para ele, “o exemplo é um desvio”. O representante do Cesa afirmou que ninguém coloca em dúvida a lisura e a capacidade técnica de procuradores da Fazenda e advogados públicos no assessoramento a juízes.
“A questão não é essa. A questão é que há desvios em casos concretos. Por isso, é recomendável criar mecanismos que evitem desvios. Quiçá impedir que o procurador seja assessor em processos nos quais atuou. O procurador não pode ser infiltrado dentro de um tribunal”, disse o advogado.
Independência funcional
O consultor da União Rafaelo Abritta, que representou a Advocacia-Geral da União, respondeu ao advogado. “Não somos nós que batemos às portas do Judiciário. São os magistrados que solicitam à advocacia pública aquele ou este advogado ou procurador. Não existe a tese de que há infiltrados”, rebateu.
Abritta esclareceu que a AGU não tem opinião contra nem a favor das cessões, mas contesta a tese da OAB/RJ de que o assessor tem uma influência crucial para as decisões. “É inegável que as decisões têm o DNA dos juízes”. Ele também afirmou que não procede imaginar que o procurador licenciado para assessorar um juiz possa sofrer pressões. “Nossa lei orgânica assegura a autonomia, a independência para exercer sua função”, disse.
Como ele, o representante do Sindicato dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), Hugo Mendes Plutarco, e o presidente do Fórum Nacional da Advocacia Pública, Allan Titonelli, defenderam a independência dos procuradores e advogados públicos.
Plutarco afirmou que, como prova da independência, as únicas decisões favoráveis à Vale no processo de execução saíram justamente depois que a procuradora Patrícia Lessa passou a assessorar o juiz. Já Titonelli disse que o papel do advogado público não é defender miopemente o governante de plantão ou qualquer posição estatal. Segundo ele, a lei lhes garante discricionariedade para se atuar até contra o Estado nos casos em que a ordem jurídica é ferida.
O juiz Antônio Henrique Corrêa da Silva, presidente da Associação dos Juízes Federais do Rio de Janeiro e Espírito Santo, afirmou que proibir que juízes requisitem advogados públicos ou que possam ter advogados privados como assessores, o que chegou a ser defendido, “é relegar essa função aos bacharéis que não logram êxito no Exame de Ordem” — ou seja, desqualificar a assessoria dos magistrados.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Nelson Calandra, disse que a independência funcional permite a isenção. “Não podemos pegar um livro de um conselheiro do CNJ, por exemplo, e dizer que ele não pode julgar um processo por conta de posições que ele defendeu como doutrinador”.
Influência nas decisões
O advogado Bruno Garcia Redondo, do Sindicato dos Advogados do Rio de Janeiro, disse que a entidade que representa é contra o assessoramento de advogados públicos ou provados. “O assessor influencia, sim, ainda que minimamente, as decisões do magistrado. Se há o risco de imparcialidade, deve haver o impedimento, até para resguardar a imagem das instituições”, afirmou.
Ronaldo Cramer, que representou a OAB do Rio, disse que a influência dos assessores em meio à montanha de processos é algo que se torna importante. “Os juízes decidem e elaboram seus votos, mas dependem de uma boa assessoria. E é inegável que o assessor tem influência sobre a formação do convencimento deles”, disse.
De acordo com Cramer, não é possível determinar a participação do assessor no julgamento. E, em hipótese nenhuma, a OAB/RJ está colocando em xeque a imparcialidade do Judiciário. “Nossa preocupação é com a imagem. Por isso são necessárias regras para coibir as tentações”.
No processo, a OAB/RJ sustenta que a quebra da imparcialidade é clara. “Em tese, a situação seria semelhante, se possível fosse, a um advogado atuar como assessor de desembargador, mas manter-se como sócio de um escritório particular”, alegou o representante da entidade. O objetivo da Ordem é que o Conselho edite resolução para vedar a cessão de procuradores da Fazenda Nacional ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, “especialmente para exercer cargo em comissão em Turmas Especializadas com competência para processar e julgar matéria tributária”.
Para o conselheiro Bruno Dantas, que participou da audiência pública, a situação, especialmente a do caso concreto, levanta questionamentos. “Como a procuradora que fez sustentação oral peticionou e em seguida foi requisitada para o tribunal para assessorar o juiz que cuida dessa causa e subsidia a decisão do magistrado?”, questionou.
O conselheiro Jorge Hélio refutou a ideia de que o assessor não tem nenhuma influência sobre o juiz. “Qual seu papel, então? Tirar a caspa do paletó? O juiz é responsável pelo que assina, mas o assessor influencia, sim”, afirmou.
De acordo com informações dos participantes, há, hoje, 11 advogados públicos cedidos ao Supremo Tribunal Federal e sete ao Superior Tribunal de Justiça. Todos trabalhando em gabinetes de juízes. O relator do PCA, José Lúcio Munhoz, afirmou que liberará para seu voto para julgamento em agosto, para que o CNJ defina a questão.
Rodrigo Haidar é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.
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