36 anos sem JK – o dom de irradiar esperança que renasceu em Lula
Hoje, 22 de Agosto de 2012, completam-se 36 anos do misterioso
acidente automobilístico que matou nosso presidente “Bossa Nova”.
Republico uma crônica, escrita em 2009, em que traço um paralelo entre
as figuras humanas de JK e Lula, bem como suas conturbadas relações com
a imprensa.
O dom de irradiar esperança – JK, Lula e a imprensa
- Não posso deixar de dedicar este artigo, com esta temática política tão especial, ao meu mestre e amigo Gilson Caroni Filho. Assim, faço jus a quem irradiou em mim o gosto por analisar a mídia e o encantamento pelas ciências políticas.Por Ana Helena Tavares
Inúmeras já foram as vezes que Lula se comparou a JK. “Não acredito em
quem não tem objetivos, não tem projetos, não sonha alto. Eu acredito
em gente como Juscelino”, declarou Lula a Claudio Bojunga para o livro
“JK – O Artista do Impossível”.
Incontáveis são as vezes que Lula é atacado por conta desta comparação.
“Quando vejo o Lula se comparar com Deus, todo poderoso, não me
importo. Quando o vejo se comparar a Getúlio Vargas, também não dou
muita importância. Mas eu realmente saio do sério quando vejo o
apedeuta (ignorante, pessoa sem instrução) querer se comparar ao JK.”,
já chegaram a dizer em um dos milhões de blogs espalhados pela rede.
Ora, por que esta comparação tira tanta gente do sério?
Será então porque JK era médico e Lula largou cedo os estudos
regulares? Francamente! Como são apedeutas os que pensam assim!
Principalmente aqueles que gostam de se colocar na posição de “deuses”,
acima dos “meros mortais”, usando palavras como “apedeuta” e achando
que é isso que vai mostrar alguma coisa nessa vida. Senão vejamos… Os
EUA que o digam… George Bush ostenta diploma de historiador (vejam
isso…) e Abraham Lincoln (considerado um dos maiores presidentes dos
EUA) jamais cursou escolas regulares. Será que restam dúvidas de que
não é isso que influencia?
Que a ascensão à presidência de uma pessoa como Lula incomoda a muitos,
nós sabemos. Só o fato de aquele retirante estar lá no Planalto já
enfurece muita gente, é de se entender que fiquem mais enfurecidos
ainda quando aquele ousado retirante se compara ao “Dr. JK”. Só que JK
ganhou a simpatia da história não porque se achava um “Dr.”, mas pelas
vezes que sentou-se numa roda de violão cantando que o “peixe vivo não
pode viver fora da água fria”.
Explico-me: talvez ele não tenha sido uma figura de grande carisma em
sua época, haja visto que foi certamente um dos presidentes mais
surrados pela imprensa e é óbvio que isso levava uma fatia da opinião
pública a atacá-lo também. Mas a história o acolheu, não só por todas
as realizações de seu governo, mas acredito até que principalmente pela
fantástica figura humana que ele era. Títulos como o de “Presidente
Bossa Nova” não me deixam mentir. Fenômeno semelhante ocorre com Lula.
Possivelmente, entre as classes mais baixas, Lula tenha um apelo
carismático bem maior que o de JK, mas, de um modo geral, ele
representa uma “bossa (coisa) nova”. Novidade boa pra quem pensa no
futuro do país. Ameaça pras elites conservadoras e antiquadas. Assim
era JK. Assim é Lula. Figuras humanas com o dom de irradiar esperança
por onde passam. E isso dói nos olhos mais amargos.
Em 2008, durante comemoração pelos 106 anos de JK (caso estivesse
vivo), Lula afirmou: “A história, como Deus escreve certo por linhas
tortas, precisou de algumas décadas para fazer Justiça ao que
representou Kubitschek para o nosso país”. Como aconteceu com JK,
restará à história o papel de relatar com fidelidade todos os avanços
do governo Lula. E não tenho dúvida de que ela o fará. Isso porque a
imprensa que, como me disse em entrevista o jornalista Alberto Dines,
deveria ser sinônimo de “história instantânea”, infelizmente, tem
jogado no lixo essa nobre função.
Curioso e interessante contar que, pouco depois do encerramento de seu
mandato como presidente da República, na noite de 21 de janeiro de
1961, JK foi recebido com toda pompa e circunstância na sede da ABI por
aquela mesma imprensa que havia passado cinco anos bombardeando seu
governo e seu caráter e que, naquela ocasião, oferecia em sua homenagem
um farto banquete.
Na “Revista Brasileira de História” há um vasto estudo sobre o assunto,
realizado pela cientista política Flávia Biroli, intitulado “Liberdade
de Imprensa: margens e definições para a democracia durante o governo
de JK”. No estudo, verificamos que era uma relação problemática, porém,
pacífica. Ou seja, se a imprensa criticava de forma tão dura é porque
tinha liberdade pra isso. O título de uma das matérias que, na época,
cobriu o evento ao qual JK foi à ABI dizia: “O adeus com mágoa de JK”.
Ao mesmo tempo, porém, naquele final de governo, os jornalistas
pareciam profundamente agradecidos por aqueles anos de liberdade.
Sentimento resumido nas palavras de Herbert Moses, então presidente da
ABI, que fez mea-culpa, assumindo excessos, exageros e injustiças da
imprensa: “O governo Kubitschek não foi apenas um período de trabalho
intenso, de dinamismo administrativo, de desenvolvimento apaixonado:
foi também o governo em que a imprensa pôde usar mais livremente os
seus direitos. A imprensa opinou livremente, informou livremente,
criticou livremente. Muitas críticas teriam sido exageradas, muitas
excessivas, muitas injustas, com certeza. Mas exageradas ou excessivas
ou injustas, puderam ser formuladas, tiveram livre curso, não tiveram
sanções.”
Fico imaginando um banquete desses, ao final do governo Lula, e acho
que, de ambos os lados, os sentimentos não se fariam diferentes. Lula
tem uma centena de motivos totalmente palpáveis pra se dizer magoado
com a imprensa. A imprensa, por sua vez, não tem um motivo sequer pra
reclamar de Lula quanto a qualquer tipo de censura. Seria no mínimo
interessante um banquete desses reunindo Civitas, Frias e Marinhos…
Haja mea-culpa!
O grande mérito de quem é ofendido está em não perder a cabeça. Temos
aí mais um ponto em comum entre os dois presidentes. Certa vez, Lula
disse: “Poucos políticos foram tão achincalhados, tão agredidos
verbalmente, tão ofendidos como Juscelino Kubitschek. Entretanto, esse
homem nunca levantou a voz nem perdeu a responsabilidade com o país.”
Quem não enxerga a responsabilidade de Lula com o Brasil, que o julga
um aventureiro, oportunista, ou coisas do tipo, só pode ser cego.
“Devemos seguir o exemplo de Juscelino Kubitschek, que soube
transformar seus sonhos em conquistas e benefícios para o Brasil.”,
disse Lula em almoço oferecido ao primeiro-ministro da República
Tcheca, em Março de 2006. Essas não são palavras ao vento. O espírito
empreendedor de JK está sim presente no presidente Lula. Transformar
sonhos em realidade faz parte de sua história de vida. É claro que com o
seu governo não iria ser diferente.
Eu poderia listar aqui todo o sem número de avanços do governo Lula e
comentar cada um deles, mas não é essa a proposta. Em meados do ano
passado, ao comentar um deles, Lula, mais uma vez, lembrou-se de JK:
“Juscelino Kubitschek, lá de cima, estará rindo pelo que está
acontecendo com a indústria naval brasileira.” Arrisco-me a dizer que
ele está rindo à toa desde janeiro de 2003.
Não vivemos no país dos sonhos? É claro que não! Mas a enorme confiança
que Lula gerou no povo, apesar de a imprensa não cumprir
satisfatoriamente seu papel de bem informar, além de tornar visíveis as
inúmeras realizações de seu governo, mostra que nenhum outro
presidente representou tão bem quanto ele um dos lemas que JK repetia
com mais fervor: “Política para mim é esperança”.
Por isso, se eu pudesse falar com Lula, diria: Eu também “não acredito
em quem não tem objetivos, não tem projetos, não sonha alto.” Eu
acredito em gente como você!
11 de Junho de 2009,
Ana Helena Tavares
Ana Helena Tavares
P.S. Herbert Moses dizia-se agradecido por aqueles anos em que o
governo não havia censurado nenhuma das tantas críticas tão negativas
feitas pela imprensa. Muitas injustas, como ele próprio assumiu,
tecendo suas desculpas públicas a JK. O problema é quando, na hora de
elogiar, a grande imprensa, vendida a interesses mesquinhos, censura-se
a si mesma. Periga ter que pedir desculpas à liberdade sem a qual ela
não vive e a qual ela própria tolhe. Aí é crise de identidade. Talvez
já acontecesse também naquela época…
No Quem tem medo da democracia?
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